FATOS DO BRASIL IMPÉRIO

Bem vindo ao blog FATOS DO BRASIL IMPÉRIO. Aqui são narrados fatos da época do Império, geralmente pouco conhecidos, extraídos do livro REVIVENDO O BRASIL-IMPÉRIO, que publiquei sob o pseudônimo Leopoldo Bibiano Xavier. Leitura muito útil, que dá uma visão realista do modo como o Imperador Pedro II conduzia os destinos do País.
Você está convidado a visitar também os sites referentes ao meu livro mais recente, A VOLTA AO MUNDO DA NOBREZA, que contém mais de 1.700 fatos mostrando a atuação da nobreza em diversos países e épocas:
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Leon Beaugeste

30.5.08

08 - EDUCAÇÃO, ARTE, CIÊNCIA, TECNOLOGIA - O IMPÉRIO NAS VIAS DO PROGRESSO

Em torno do Imperador, surge no País uma elite cultural e artística

As conveniências da cultura, das artes e das letras nos governos monárquicos, e o abastardamento do gosto atribuído aos regimes puramente democráticos, constituem um argumento em favor das monarquias e em desabono das repúblicas. Todos os reis conhecem isto. Sabe-se que em toda a parte e em todo o tempo os períodos mais brilhantes do desenvolvimento das letras condisseram com o maior esplendor dos tronos.
A democracia não é literária, porque é a igualdade; e a inteligência, que ela pretende nivelar, é indispensavelmente aristocrática. Nada mais aristocrático do que o grande poeta da democracia, Victor Hugo. A literatura ou a arte democrática não existem. Sendo manifestações do que há de melhor e de superior na inteligência humana, são forçosamente aristocráticas. As ciências, as letras e as artes jamais florescerão nos estados sociais onde impera a democracia.

Assis Chateaubriand comentou a respeito de D. Pedro II: “Mau grado o lamentável espetáculo de incapacidade da vida pública do Brasil, ele criou um ambiente de ordem política, que era, em larga parte, uma transposição e uma projeção da sua personalidade vigorosa. A obra mais interessante do Imperador consistiu na formação das elites no Brasil. Elites políticas, elites literárias, elites artísticas, ele se preocupava da criação de todas elas, e com uma sabedoria doce, insinuante e sagaz”.

Aos 29 anos, acabara por criar no Brasil um verdadeiro mecenato, que atinge todos os ramos da atividade literária, artística e científica. Macedo, Alencar, Gonçalves Dias, Gonçalves de Magalhães, Varnhagen, entre outros, se encarregam de elevar o nível intelectual do País, estimulados pela atenção que o Soberano dedicava às coisas literárias. Pintores, músicos e escritores encontram apoio e auxílio que chegam por intermédio de viagens de estudos, de encomendas de obras, enfim, por todas as formas de que o Imperador podia dispor. Lendo todos os jornais da Capital e das províncias, tendo à sua disposição funcionários que assinalavam os artigos que podiam interessá-lo, não somente os que se referiam à política, mas também às artes e às letras, o Imperador deseja ter dinheiro apenas para fundar escolas, para a compra de livros, de objetos de arte, de quadros, ou para financiar aqueles que ele julgava dignos de apoio.

O Imperador reunia freqüentes vezes, em sessões literárias e científicas, os homens de letras e os sábios brasileiros, para com eles examinar alguma nova produção ou discursar sobre literatura, ciências e artes. Eram as conferências conhecidas como ‘palestras imperiais’.

Na corte de Pedro II, Victor Hugo e Lamartine é que pareciam reinar. Seus livros, lidos e discutidos pela elite na língua original, haviam sido traduzidos e divulgados amplamente.
Uma certa douceur de vivre, na expressão de Talleyrand, parece estender-se sobre a sociedade brasileira, marcada pela personalidade do Imperador, cada vez mais integrado aos assuntos intelectuais. De hábitos simples, inimigo da ostentação, utiliza ainda a velha carruagem que pertenceu ao avô, D. João VI, para seus passeios habituais. Rodeia-se de gente erudita, sem distinção de cor ou de fortuna. Auxilia os artistas em suas realizações. Estimula, com dinheiro, os estudos de Pedro Américo, Gonçalves Dias e Carlos Gomes, na Europa.

Ferdinand Wolf avaliou o interesse do Imperador pelas artes: “D. Pedro não se contenta em amar e proteger as ciências e as artes, de reunir em sua Corte sábios e artistas, de os favorecer. Não faz das ciências, das letras e das artes um pedestal de sua ambição. Ele as ama por elas mesmas, e conhece muitos dos seus ramos ele próprio”. Foi, talvez, o único que teve essa elevada e desinteressada preocupação pelas artes, letras e ciências.


A instrução pública, um objetivo primordial da Monarquia

Entre as graves preocupações de D. Pedro II, durante quase meio século de reinado, um dos assuntos que sempre mereceram sua particular atenção foi o desenvolvimento da instrução pública, que ele encontrou imperfeita e mal esboçada, quando em 1840 assumiu as rédeas do governo, e que conseguiu melhorar notavelmente, com o auxílio de alguns de seus ministros mais devotados a esta nobre causa.
O historiador Max Fleiuss fornece os seguintes dados: “Em 1844 havia no Rio de Janeiro apenas 16 escolas públicas e 34 colégios particulares. Em 1860 as escolas públicas são 3.516, com mais de 115.000 alunos. Em 1889, são 300.000 alunos freqüentando 7.500 escolas”.

D. Pedro II tinha tanto interesse pelas escolas e pela educação das crianças, que repetia com freqüência:
— Se eu não fosse imperador, quisera ser mestre-escola.

Terminada a guerra do Paraguai, quis a gratidão nacional levantar ao Imperador uma estátua eqüestre, que chegou a ser modelada em gesso. Abriu-se para isso uma grande subscrição. Quando a iniciativa chegou ao seu conhecimento, D. Pedro recomendou, em carta ao presidente do Conselho de Ministros, que só empregassem seus esforços na aquisição do dinheiro necessário para a construção de edifícios apropriados ao ensino das escolas primárias e para o melhoramento material de outros estabelecimentos de instrução pública. Não queria que a sua figura fosse perpetuada em mármore ou bronze, mas em quatro edifícios consagrados à instrução popular. E concluía a carta:
“Todos os ministros passados e os atuais sabem bem o que eu penso sobre a instrução pública. De há muito venho dizendo que se deve cuidar dela muito seriamente, e que nada me seria mais agradável, agora que se fez triunfar a causa da dignidade nacional, do que ver a nova era de paz e de prosperidade começar por um ato de iniciativa do Brasil, em proveito da educação do povo”.
Foram assim edificadas as escolas do Largo do Machado, da Rua Senador Correia, da Praça XI de Junho e da Rua da Harmonia, no Rio de Janeiro.

Defendendo-se da acusação que alguns lhe faziam, de ir perturbar o trabalho das escolas com as suas visitas, D. Pedro II afirmou:
“Tenho assistido a exames e concursos, sobretudo para conhecer as habilitações individuais. Tenho assim reconhecido, por mim mesmo, muitas inteligências que têm feito figura depois. Rio Branco, lembro, fez exame em minha presença, na antiga Academia Militar. Se vou aos concursos e outras provas literárias ou científicas, é para poder dar minha opinião sobre as provas, assim como conhecer as habilitações individuais. Quantos ministros tenho eu conhecido desde o colégio? O tempo que nisso gasto é para mim quase que mero cumprimento de dever, tendo eu tantos outros estudos ou leituras que preferiria fazer. Tenho ido a conferências e outros atos, porque sempre desejei animar as letras e as ciências”.

O “Le Petit Journal”, por ocasião da morte do Imperador, afirmou: “Pode-se dizer que tudo quanto se fez de generoso no Brasil, de 50 anos para cá, foi inspirado por ele”.


O Imperador incentiva e fiscaliza pessoalmente a instrução pública

Em 1846, D. Pedro II visitou em São Paulo a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. No salão dos atos, ouviu o discurso do diretor, Avelar Brotero, e poesias de alguns estudantes. Voltou depois para assistir aos exames, como sempre gostou de fazer.
José Antonio Saraiva, futuro conselheiro e um dos estudantes de então, escreveu para a família, a propósito dessa visita do Imperador: “É afável com todos, dirige-se a qualquer um, faz-lhe perguntas e procura informar-se das menores particularidades. Tem andado a pé como simples cidadão, só acompanhado daquelas pessoas que o querem acompanhar sem aparato nenhum, e isto sem a menor quebra de sua dignidade, pois sua circunspeção, suas belas maneiras, fazem com que todos o estimem e respeitem. O entusiasmo tem sido grande, e ele está muito contente. É muito vivo, e segundo dizem todos, tem instrução superior à sua idade”.
Um mês depois o Imperador voltou, para apreciar a defesa de tese de dois bacharéis, um dos quais foi reprovado. Datam dessa época as primeiras anedotas sobre a sua severidade como fiscal do ensino. Nunca mais uma congregação de academia se deixaria surpreender pela visita imperial. Passaria a ter o cuidado de preparar os estudantes, prevenir imprevistos.
Aos vinte anos, D. Pedro começou um ofício que desempenharia pelo resto da vida: inspetor geral da educação no Império. Presidia à mesa de examinadores, e às vezes perguntava também. Embaraçava os alunos e espicaçava os professores, com a sua proverbial memória e a sua erudição. Dizia que o ensino devia elevar-se, e dava o exemplo, fiscalizando-o com uma tenacidade inigualável. Insistia para que moralizassem a instrução. E não confiava nas informações oficiais, mas ajuizava com os próprios olhos.

O Imperador visitava assiduamente o Colégio Pedro II, que tinha em grande estima. Fernando Magalhães narrou a impressão que lhe causavam essas visitas: “No Colégio, subitamente, a sineta que batia o toque simples do início da aula, ou o dobrado do fim do recreio, entrava a bimbalhar repetidamente, num aviso de festa. Já se sabia: era a visita de Dom Pedro II. Ele a fazia freqüentemente, corria todas as aulas, subia ao estrado do professor, sentava-se na cadeira ao lado e entrava a questionar os meninos como um mestre-escola cuidadoso e paciente. Tenho na memória a sua lembrança, tanto me impressionou a beleza singular daquele velho plácido e corpulento, um grande corpo que as pernas já vacilavam em carregar, uns olhos que o tempo se comprazia em azular cada vez mais na suavidade, uma fronte larga e polida, barbas brancas de santo, rosto feliz de abnegado, atitude tranqüila de justo, vulto inconfundível de nobre”.

Em 1875, D. Pedro II e D. Teresa Cristina visitam em São Paulo o Seminário N. Sra. da Glória, das Irmãs de São José, sendo provincial Madre Maria Teodora Voiron. Percorrem todas as dependências do educandário, e ao chegar ao dormitório D. Pedro diz aos acompanhantes:
— Essas Irmãs de Caridade são as mesmas em toda a parte. São aqui como no Rio.
— Perdão, Majestade – responde a Madre Superiora –, vosso hospital no Rio é a riqueza. Aqui é a pobreza.
— Tendes o mais belo dos luxos: o asseio – comenta o Imperador.

O diretor da Faculdade de Medicina foi falar ao Imperador sobre o regulamento de ensino. Tal foi a erudição de D. Pedro II, ao discutir os vários assuntos, que o professor comentou depois:
— Ora essa! O Imperador sabe mais Medicina do que eu!


Entre poetas e escritores, o Imperador cria e estimula uma elite intelectual

O Imperador costumava reunir os literatos e os professores do Colégio Pedro II, aos sábados, no salão do externato, para se entreterem em animadas palestras literárias, quando eram lidas as produções inéditas de qualquer dos presentes, às vezes dele próprio.
Numa dessas noites, em que o programa tinha sido particularmente cansativo, o Barão Múcio Teixeira, para evitar de cochilar, pegou um lápis e começou a esboçar a caricatura do Monarca, mas de tal modo que ele não pudesse ver de que se tratava. Terminada a leitura, que o Imperador acompanhara atentamente, voltou-se para o caricaturista e pediu:
— Deixe ver se está parecido comigo.
Sem compreender como ele se inteirara dos seus movimentos, apesar de toda a cautela, o Barão passou-lhe o desenho. O Imperador sorriu, complacente, mostrou a caricatura ao Reitor, e ela foi passando de mão em mão, entre comentários e risadas. Quando completou o percurso, D. Pedro dobrou-a, meteu-a no bolso e disse:
— Gosto mais dos seus versos do que das suas caricaturas. Mas guardo-a como lembrança.

Castro Alves e Fagundes Varela eram com igual atenção recebidos pelo Monarca, diante de quem iam recitar em primeira mão as suas composições poéticas.

Quando Salvador de Mendonça perguntou ao poeta Francisco Otaviano como ia o Imperador, obteve esta resposta:
— Sempre a fazer maus versos e a criticar os bons!

Em 1887, o deputado Joaquim Nabuco pediu ao Imperador permissão para publicar uma de suas peças em verso. Este respondeu:
— Sei muito bem que não sou poeta. Faço versos, de vez em quando, como exercício intelectual, e somente quando não tenho outra coisa a fazer. Isso, porém, não é poesia. Mostro aos amigos íntimos esses trabalhos, mas por nenhum preço eu os queria ver publicados.
D. Pedro II mostrou um dos seus sonetos a Moniz Barreto. O poeta e repentista, depois de lê-lo, comentou:
— Se eu tivesse perpetrado tal crime, Senhor, suicidar-me-ia.
O Imperador, inteiramente despreocupado de ser tido como literato, retrucou sorridente:
— Ora, Senhor Moniz Barreto. Tu te fizeste réu de sandices muito maiores, e ainda estás vivo!

Quando Charles Expilly, autor do célebre livro “Mulheres e Costumes do Brasil”, apresentou-se a D. Pedro II, o Monarca acolheu-o animadamente, dizendo:
— Conheço este nome.
— Talvez seja o de Claude Expilly, comentador de sentenças...
— Não! Não!
— Vossa Majestade quer falar então de Alexandre Expilly, deputado pela Bretanha em 89...
— Charles Expilly! Eis o nome que li assinando vários folhetins e jornais parisienses. É o seu, ou de algum de seus parentes?
— Sou forçado a convir que é bem o meu nome, esse que Vossa Majestade reteve – respondeu Expilly, justamente maravilhado de que um nome tão obscuro na França fosse conhecido do Imperador do Brasil.

Em 1869, trabalhava o Dr. Ramiz Galvão como cirurgião no Hospital Militar, onde atendia alguns doentes vindos do Paraguai. Em visita ao hospital, D. Pedro II perguntou ao cirurgião:
— Que atividades tem exercido?
— Senhor, preparo-me para escrever uma memória sobre o Mosteiro de São Bento, ao qual sou muito grato. Ali encontrei informações preciosas e documentos que contradizem certas afirmações injustas.
— Está bem. Continue. E quando a tiver pronta, apresente-a ao Instituto Histórico.
Concluída a obra, foi entregue ao Instituto, mas um ano depois ainda não havia sido publicada. Encontrando-se casualmente com Ramiz Galvão, o Imperador lhe perguntou:
— E o seu trabalho sobre o Mosteiro de São Bento? Não o levou avante?
— Sim, Senhor. Há longos meses que o entreguei na secretaria do Instituto.
— Como?! Não tenho notícia disso. Vou indagar.
Pouco tempo depois o trabalho era publicado.


Carlos Gomes, Pedro Américo, Vítor Meireles – Os grandes artistas e o bolsinho do Imperador

A despeito de não se incluir entre os soberanos mais aquinhoados pela fortuna, D. Pedro II realizou sacrifícios financeiros por amor à arte e à ciência.
Não limitava a proteção oficial, ou a que ele diretamente concedia, ao período de formação do artista. Nunca perdia de vista o bom artista, amparava-o, dava-lhe empregos, incumbia-o de encomendas e decorações e adquiria-lhe as obras para si ou para a Pinacoteca, por ele fundada e enriquecida.

Da Itália nos vinha o nome glorificado de Carlos Gomes. Graças à pensão que lhe dava pessoalmente o Imperador, conseguira concluir os estudos. Jamais outro compositor brasileiro alcançou o sucesso de “O Guarani”, cuja estréia se deu no Teatro Scala de Milão.

Conversando com o Visconde de Taunay, D. Pedro II comentou a ópera “Schiavo”, de Carlos Gomes, e acrescentou:
— Estou disposto a custear pessoalmente a montagem da peça.
— Repare, Senhor, que serão necessários 40 contos de réis.
— Não! Com a breca, isso não! Não sou tão rico assim. Em todo caso, fale com os empresários e venha entender-se comigo. Podemos contar com o sucesso da obra.

Carlos Gomes declarou:
— Se não fosse o Imperador, eu não seria Carlos Gomes.
Embora aureolado por um nome glorioso, que honrava o Brasil, Carlos Gomes ficara pobre após o 15 de novembro. Fora mantido pessoalmente por D. Pedro II, e a República se recusou a conceder-lhe uma pensão, por ser amigo da Família Imperial. Apesar disso, quando lhe foi feito o convite para compor o hino da República, não aceitou, como nobre homenagem de gratidão ao seu protetor destronado.

Na pintura, dois jovens brasileiros fixavam na tela cenas da nossa história ou fatos heróicos dos nossos soldados. Chamavam-se Vítor Meireles e Pedro Américo.
Vítor Meireles iria dar-nos, sucessivamente, entre outras telas, “Primeira Missa no Brasil”, “Combate de Riachuelo” e “Batalha de Guararapes”. Pedro Américo nos daria outras grandes telas: “Batalha do Avaí”, “Juramento da Princesa Isabel”, “Batalha do Campo Grande” e “Grito do Ipiranga”. Esta última tela fora exposta pela primeira vez em Florença, onde o autor terminava seus estudos de pintura por conta do “bolsinho de Sua Majestade”.

O Imperador conheceu Pedro Américo no Colégio Pedro II. Enquanto ele visitava uma aula de aritmética, o estudante fez um desenho do Monarca, que lhe foi entregue. Perguntado se gostaria de estudar na Academia Nacional de Belas Artes, Pedro Américo ficou encantado com a oportunidade, e logo começou os estudos, às expensas do Imperador. Posteriormente, foi também ele que custeou o prosseguimento dos estudos na Europa.

A arte brasileira, com o desaparecimento do espírito que a nutria, se conserva numa espécie de recolhimento, como que à espera de um novo mecenas, desvelado e magnânimo.


O Imperador cria hábitos de seriedade nas instituições científicas

Um artista lírico, em visita ao País, escreveu: “O Imperador anima, com sua presença, todas as instituições que julga úteis para melhorar o País, e a modesta dotação que lhe é fixada no orçamento é absorvida por obras de caridade. Dom Pedro possui conhecimentos muito amplos. Preside ao Instituto Histórico e Geográfico todas as sextas-feiras, menos por pedantismo do que para estimular os trabalhos relativos ao Brasil”.
Com inquebrantável pontualidade, o Imperador presidia a todas as sessões do Instituto Histórico, devotando-lhe o maior carinho. Como acentuou o diplomata e escritor Vicente Quesada, ele assim procedia para infundir, com o seu alto exemplo, hábitos de seriedade às instituições dessa ordem.

Em setembro de 1880, reunia-se no Rio o Primeiro Congresso Nacional de Medicina. Terminados os trabalhos, e desanimada de obter dos cofres públicos os necessários recursos para impressão dos anais, a comissão organizadora resolveu apelar para o Imperador, que respondeu:
— Como foi por falta de verba que o Governo mandou sustar a publicação dos trabalhos do congresso, não posso eu, primeiro guarda das leis do País, concorrer para fazerem-se despesas não decretadas. Amigo, porém, da ciência e dos progressos de minha terra, terei muito gosto em tomar a mim essa despesa.
No dia seguinte eram dadas as ordens para a impressão dos trabalhos do congresso.

O Dr. Antonio Ennes de Souza venceu um concurso para a cadeira de Mineralogia da Escola Politécnica, assistido pelo Imperador. Depois de nomeado, subiu ao Palácio da Boa Vista para agradecer, e resolveu esclarecer que tinha idéias republicanas. Ouviu este conselho:
— Senhor Ennes, deixe de política. Dedique-se à ciência. O senhor é moço, e tem um vasto campo diante de si.

Em Washington, D. Pedro II foi visitar o observatório. Dado o seu interesse por questões de Astronomia, examinou tudo cuidadosamente. De um modo geral, achou-o bem montado. Mas o regulador elétrico da hora, a que correspondiam quatro relógios da cidade, não lhe pareceu tão perfeito quanto o do observatório do Rio de Janeiro. Achou o cosmógrafo colocado sem a necessária estabilidade, e o relógio standard, para observações, mal colocado.
Mostraram-lhe depois o “grande relógio”, que registrava observações astronômicas por meio de eletricidade, e fora o primeiro do gênero. Estava parado, e ninguém sabia consertá-lo. O astrônomo Newcomb, que acompanhava o Imperador, ficou assombrado quando viu D. Pedro passar uma mão por baixo do móvel e começar a examinar pacientemente a base que suportava o relógio. Feito isso, demonstrou-se admirado de que estivessem usando um aparelho desnivelado como aquele. Verificou-se depois que esse era o único defeito, que impedia o aparelho de funcionar.


O Instituto Pasteur demonstra sua gratidão ao Imperador

Na Academia das Ciências, em Paris, o Imperador foi ouvir de Pasteur a exposição dos resultados das suas experiências. Para encerrar a sessão, o grande cientista saudou a presença de D. Pedro com as seguintes palavras:
— Nosso augusto colega Dom Pedro de Alcântara, que, como todos sabem, gosta de esconder seu cetro imperial sob as condecorações acadêmicas que recebe do mundo inteiro.

Dom Pedro II foi um dos primeiros grandes admiradores de Pasteur, dos que acreditaram no valor dos seus trabalhos e deram apoio às suas famosas experiências. Várias vezes tentou induzir o grande cientista a vir prosseguir seus estudos no Brasil, não precisamente sobre a raiva ou o cólera, mas sobre um mal que dizimava então entre nós milhares de criaturas por ano: a febre amarela. O Imperador estava persuadido, apesar da completa ignorância que se tinha então sobre a origem dessa moléstia, de que Pasteur podia bem isolar-lhe o bacilo, descobrindo depois uma vacina eficaz. A esse propósito, escreveu a Pasteur:
“Encontrareis aqui culturas feitas com o maior cuidado para o exame dessa questão, e ainda que não pudéssemos vos ser reconhecidos pela descoberta da vacina dessa moléstia, vossa visita ao meu país será um acontecimento que terá a maior influência sobre o progresso científico do Brasil. Meus sentimentos por vós e meu amor à ciência vos são bem conhecidos, e desde já me alegro de vos acolher aqui como mereceis, não fazendo com isso senão acompanhar o sentimento de todo o meu país. Vossos estudos sobre a raiva não seriam abandonados senão por pouco tempo, e o serviço prestado à humanidade, preservando-a da febre amarela, seria pelo menos de idêntico alcance”.
Todas as tentativas foram vãs. Pasteur não pôde atender aos desejos do Imperador: “Depois de muitas reflexões e hesitações, devo render-me aos conselhos de meus médicos: tenho a profunda tristeza de não poder aceitar o oferecimento de Vossa Majestade”.

D. Pedro II nunca foi esquecido no Instituto Pasteur. Por volta de 1900, dez jovens médicos brasileiros recém-formados foram designados para seguir os cursos no Instituto. Chegando a Paris, apresentaram-se ao secretário, que lhes informou:
— Muito tarde, senhores. O registro de inscrições já está fechado. Havia apenas cem vagas, e todas já foram preenchidas.
Um dos médicos, Afrânio Peixoto, não desistiu, e resolveu procurar o próprio diretor do Instituto, em nome dos colegas. O Professor Roux recebeu-o sem delongas, e logo perguntou:
— Então o senhor é brasileiro?
— Sim, senhor.
— Bem, deve reconhecer este personagem – e indicou com a mão um busto de mármore branco.
— É o nosso Imperador, D. Pedro II!
— Sim, senhor. Dom Pedro, Imperador do Brasil. Talvez não saiba que, quando meu mestre Pasteur não tinha ainda conseguido vencer todas as hesitações, todas as dúvidas, foi vosso Imperador, seu amigo, quem lhe trouxe os primeiros cem mil francos necessários à fundação deste Instituto. Como é, então, que nesta casa não haverá sempre lugar para brasileiros? Não quero, naturalmente, prejudicar os estudantes já admitidos, mas este ano, como grande exceção, mandaremos colocar mais um banco na sala do curso, e teremos cento e dez ouvintes, em vez dos cem habituais.


Nosso Imperador, promovendo o desenvolvimento material do País

Sob o ponto de vista do progresso e do desenvolvimento material do País, o Império não foi o atraso e a estagnação de que ainda hoje é acusado pelos que não se querem dar ao trabalho de estudar e conhecer melhor esse período da nossa História. Na verdade o Brasil era, de fato e de direito, a primeira nação da América Latina. Essa hegemonia, ele iria conservar até o último dia da Monarquia.

Foi das mãos de D. Pedro II que o Brasil saiu apto a enfrentar as dificuldades políticas do continente e do século: pacificado e unificado pelo Imperador, o Brasil se impôs ao respeito internacional, disseminou a instrução, consolidou a linha de suas fronteiras, estabilizou a moeda, bateu-se vitoriosamente nas guerras que lhe foram impostas, tratou de igual para igual as maiores potências, não reconheceu hegemonias no hemisfério, construiu a terceira esquadra do mundo. Apoiado em dois grandes partidos nacionais, praticou o parlamentarismo. Criou uma elite intelectual, moral, social e política, foi um fecundíssimo viveiro de valores humanos, aboliu o tráfico e a escravidão, insuflou as nossas maiores riquezas econômicas, aparelhou a indústria, construiu uma enorme rede de comunicações rodoviárias e ferroviárias, ligou-nos à Europa pelo cabo telegráfico, o telefone, a tração a vapor, impulsionou as ciências e as letras, conheceu intimamente aquilo que Cícero preconizava como a suprema ventura dos povos: o gozo tranqüilo da liberdade.

Em 1874, o irlandês Hamilton Lindsay-Bucknall veio ao Brasil, com a equipe encarregada de instalar o primeiro cabo submarino no País. Posteriormente escreveu um livro narrando a sua viagem, no qual contam as seguintes referências:
“O navio cabográfico Hooper finalmente colocou em terra, sã e salva, a extremidade do primeiro cabo submarino no Brasil. E o bom Imperador Dom Pedro II poderia ser visto nessa ocasião, ajudando nobremente a puxar aquele cabo que em pouco tempo colocaria seu grande Império em comunicação direta com o resto do mundo civilizado. Que esplêndido exemplo nos fora dado pelo grande e sábio Dom Pedro II, Imperador do Brasil, não só se interessando pessoalmente pela instalação do cabo submarino, mas também dando uma mão para puxá-lo para a praia!
Logo depois da amarração da extremidade do cabo submarino à terra, foram recebidas mensagens congratulatórias transmitidas ao Imperador pelos governadores do Pará, Pernambuco e Bahia. Os telegramas para o Imperador me foram confiados para entrega. Ao chegar ao palácio, fui conduzido sem cerimônia à presença de Sua Majestade Imperial. O Imperador, que estava sentado na varanda apreciando uma xícara de café, em companhia de diversos visitantes, levantou-se para receber-me e apertar-me a mão. O conteúdo dos telegramas pareceu satisfazê-lo muito e, a seu pedido, sentei-me ao lado. Fez-me então muitas perguntas sobre o cabo submarino, a respeito do qual parecia estar profundamente interessado. E não podia haver dúvida, pela natureza de suas perguntas e pelo conhecimento de eletricidade que demonstrava, de que não se tratava de um novato naquela ciência. Prontamente verifiquei o acerto dos que o diziam um dos mais inteligentes e altamente dotados dos soberanos reinantes. Permaneci em sua companhia por algum tempo, durante o qual nossa conversa convergiu para diversos tópicos. Senti-me tomado de profundo respeito por aquele sábio homem que rege os destinos de um dos mais admiráveis impérios do mundo”.

Estava em andamento a construção da estrada de ferro para a subida da Serra do Mar, e discutia-se qual o sistema a ser adotado. Havia pouca experiência no assunto, e predominava a opinião dos técnicos ingleses, que eram os concessionários. Cristiano Otoni defendia a outra solução. Em reunião do Conselho de Estado, que decidiria o assunto, o Imperador determinou:
— Ouçamos antes o Sr. Otoni.
E assim se evitou o erro da construção pelo sistema inglês.

Em visita à exposição de Filadélfia, em 1876, o Imperador passou pelo stand de Graham Bell, que a duras penas conseguira inventar e expor ali o protótipo do telefone. Pouca atenção atraíra o seu stand. Bertita Harding narra o encontro:
“Ajustando inúmeras bobinas, eletrodos e discos de metal, Bell preparava-se para demonstrar a invenção. Por fim anunciou:
— Dei a isto o nome de telefone.
Estendeu ao Imperador um objeto em forma de taça, pedindo-lhe que o conservasse pegado ao ouvido. Afastou-se depois a razoável distância, e falou para o outro objeto de forma similar, que levava nas mãos, enquanto os espectadores, de pé, observavam-no com mal dissimulada incredulidade. De repente, D. Pedro deu um pulo”:
— My God! It speaks!
— “Sim – respondeu pelo fio a voz de Bell –, isto fala. Não tardará muito para que o telefone seja uma necessidade em todas as casas.
Os olhos de D. Pedro brilhavam de admiração e surpresa:
— Meus parabéns, Sr. Bell! Quando a sua invenção for posta no mercado, o Brasil será o seu primeiro freguês”.
E cumpriu a palavra. Bell recebeu encomendas do Rio muito antes que o telefone fosse comercialmente explorado. Foi Dom Pedro, graças à sua incansável curiosidade científica, que pôs em relevo e valorizou a descoberta do jovem professor de Boston. O telefone ficou sendo uma das sensações da exposição, e quando ele se tornou um produto comercial, o Imperador foi dos primeiros a utilizá-lo na prática.

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