FATOS DO BRASIL IMPÉRIO

Bem vindo ao blog FATOS DO BRASIL IMPÉRIO. Aqui são narrados fatos da época do Império, geralmente pouco conhecidos, extraídos do livro REVIVENDO O BRASIL-IMPÉRIO, que publiquei sob o pseudônimo Leopoldo Bibiano Xavier. Leitura muito útil, que dá uma visão realista do modo como o Imperador Pedro II conduzia os destinos do País.
Você está convidado a visitar também os sites referentes ao meu livro mais recente, A VOLTA AO MUNDO DA NOBREZA, que contém mais de 1.700 fatos mostrando a atuação da nobreza em diversos países e épocas:
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Leon Beaugeste

29.5.08

07 - A ESCRAVIDÃO - EXTINGUINDO UMA HERANÇA INGRATA

Abolir a escravidão, desejo ardente do Imperador

A Princesa Isabel, ao abolir a escravidão, era a intérprete dos sentimentos do seu pai.
O literato e diplomata argentino Hector Varela ouviu do Imperador:
— A escravidão! Acredita o senhor que haja no Brasil algum compatriota que deseje mais ardentemente do que eu a abolição? Nenhum! E os primeiros a saber como eu penso são os que trabalham à frente do belo movimento de emancipação. Alguns me atacam, com marcada injustiça, afirmando que eu retardo a hora, que no entanto será a mais feliz do meu reinado, em que não haja um só escravo em minha Pátria, e que o último desses infelizes seja tão livre quanto eu.

A ação do Imperador para promover e preparar a liberdade dos escravos não podia deixar de ser lenta, e só poderia ser eficaz se fosse constante. Ele precisava convencer os homens políticos e atrair o concurso da Nação. Percebe-se hoje que nesse trabalho as interrupções não foram senão aparentes, mas, para chegar aos resultados, ele não quebrou os moldes que a Constituição lhe traçara.

Em 1850, quando se discutia a lei de repressão do tráfico de escravos, e se mostrava ao Imperador os perigos a que a lei exporia o trono, D. Pedro II, então com 25 anos, replicou com energia:
— Prefiro perder a coroa a tolerar a continuação do tráfico de escravos.

Em 1870, durante uma reunião do Imperador com o Conselho de Ministros, o Barão de Cotegipe argumentava:
— A questão da emancipação é semelhante à pedra que rola da montanha. Nós não a devemos precipitar, porque seremos esmagados.
— Não duvidarei de me expor à queda da pedra, ainda que seja esmagado – replicou D. Pedro II.

Durante a viagem à Europa, em 1871, D. Pedro II disse ao Visconde Nogueira da Gama:
— Nunca deixei de ser grato à sua avó pela delicadeza com que, em fevereiro de 1845, hospedou-me em sua fazenda de S. Mateus. Principalmente por ter festejado a minha chegada libertando, nesse mesmo dia, uma família que era sua escrava. Pois ninguém melhor do que o senhor conhece quais foram sempre os meus sentimentos a respeito da escravidão.

Votava-se no Senado a Lei do Ventre Livre, a 28 de setembro de 1871. Nas galerias repletas, apareciam as figuras mais eminentes do mundo diplomático. A discussão do projeto foi brilhante e vigorosa, sob a presidência do Visconde de Abaeté. Quando se verificou, pela votação, a vitória do Visconde do Rio Branco, que defendera a aprovação da lei, o povo que enchia as galerias irrompeu em manifestações ao grande estadista, lançando-lhe sobre a cabeça braçadas e braçadas de flores.
Terminada a sessão, o embaixador dos Estados Unidos, James Rudolph Partridge, desceu ao recinto para felicitar o presidente do Conselho e os senadores que haviam votado o projeto. Colhendo algumas flores, das que o povo atirara a Rio Branco, declarou:
— Vou mandar estas flores ao meu país, para mostrar como aqui se fez, deste modo, uma lei que lá custou tanto sangue!

Foi em Alexandria, no Egito, que D. Pedro II soube que em seu vasto Império, a partir de 28 de setembro de 1871, todas as crianças nasceriam livres. O Visconde de Itaúna, camarista de D. Pedro, anotou em uma carta:
— Eu nunca vi o Imperador tão satisfeito.


A ação abolicionista do Imperador: constante e imensa

O Imperador foi o emancipacionista mais pertinaz e mais constante que o Brasil possuiu. Foi abolicionista tanto quanto pode ser um rei compenetrado da sua missão de chefe de Estado, incompatível com a de chefe de partido, por mais simpático que seja o seu programa. Consagrou ao abolicionismo uma atividade de herói, incompatibilizando-se com os políticos, atraindo antipatias e, por fim, sacrificando-lhe a coroa.

Joaquim Nabuco, após as lutas abolicionistas, avaliou a ação do Imperador no processo de emancipação dos escravos: “É certo que a ação pessoal do Imperador se exerceu principalmente, desde 1845 até 1850, no sentido da supressão do tráfico, e desde 1866 até 1871, em favor da emancipação dos filhos nascidos de mulher escrava. A parte que tocou ao Imperador, em tudo o que foi feito em prol da libertação, foi imensa, foi essencial”.

Em 1840, o Imperador libertou todos os escravos que herdara. Além disso, tomou emprestada a quantia de sessenta contos de réis, que entregou ao seu mordomo para comprar anonimamente um lote de escravos. Em seguida libertou-os e os empregou no serviço da imperial quinta de Santa Cruz, dando-lhes salário mensal, assistência médica e educação dos filhos.
O Imperador tinha o usufruto de alguns cativos chamados “escravos da coroa”, dos quais não podia dispor livremente, por não serem de sua propriedade particular. Porém sempre os considerou como seus protegidos. Eles recebiam salário mensal, e os filhos freqüentavam a escola que fundara para os empregados da imperial quinta de São Cristóvão.
Durante a guerra do Paraguai, favoreceu a libertação dos escravos que quisessem tomar armas. Na fazenda de Santa Cruz, encarregou-se da educação dos filhos dos libertos que partiram para a guerra, e libertou às suas custas as mulheres e filhos desses defensores da Pátria.

Zacarias de Góis e Vasconcelos, presidente do Gabinete em 1864, recebeu de D. Pedro II estas instruções: “A medida que me tem parecido profícua é a liberdade dos filhos dos escravos, que nascerem daqui a um certo número de anos. Tenho refletido sobre o modo de executar a medida, porém é da ordem das que cumpre realizar com firmeza, conforme as circunstâncias o permitirem, remediando os males que ela necessariamente originará”.

Em 1886, visitando D. Pedro II a província de São Paulo, e vendo em uma cadeia um escravo, disse-lhe:
— Espere, meu preto, tenha paciência, que eu vou tratar já da sua liberdade.
Voltou-se então para o presidente da Câmara Municipal, que o acompanhava, e acrescentou:
— Faça um requerimento em nome desse infeliz, dizendo que tem a quantia necessária para a sua alforria.
Vendo porém que o vereador continuava a acompanhá-lo, exclamou:
— Ande, que eu tenho pressa, e não quero sair daqui sem ver isso feito.
E mandou o mordomo remeter ao possuidor daquele escravo a quantia necessária para libertá-lo.

Em uma das suas audiências do sábado, em que atendia a toda a gente, recebeu D. Pedro II no Paço da Boa Vista um preto velho, que se queixava dos maus tratos de que era vítima:
— Ah, meu Senhor grande, como é duro ser escravo!
— Tenha paciência, meu filho. Eu também sou escravo das minhas obrigações, e elas são muito pesadas. As tuas desgraças vão diminuir.
E mandou alforriar o preto.

Em 1866, em visita à cidade de Lorena, em São Paulo, o Imperador foi convidado a entregar a dois escravos as suas cartas de alforria, e comentou na ocasião:
— Nada me poderia ser mais agradável, para comemorar a minha visita, do que conceder liberdade a cativos.
Em Campinas, ao acabar de emancipar um escravo, o Imperador, com surpresa para todos, apertou a mão do negro e encorajou-o com sua palavra amiga.

Visitando a cadeia de Taubaté, viu o Imperador um alçapão, cautelosamente fechado com antecedência, e indagou o que havia lá embaixo. Ao saber que nesse antro se encontravam cinco escravos, por ordem dos respectivos senhores, desceu e ali encontrou uns miseráveis pretos, que eram “atrevidos e incorrigíveis”, segundo a explicação do inconsciente carcereiro.
A cadeia era no pavimento térreo do edifício da Câmara Municipal, e o Imperador logo perguntou ao respectivo presidente se achava que o possuidor de escravos devia ser auxiliado pelas autoridades em corrigir fora de casa esses infelizes. E acrescentou:
— Entendo que o senhor de escravos não pode castigá-los fora de sua casa.
O episódio foi divulgado por um jornalista que o acompanhava. Durante todo o resto da viagem, o Imperador alegrou-se por não encontrar mais nenhum negro naquelas condições, provavelmente como resultado da sua intervenção.


Premiando os libertadores de escravos, o Imperador incentiva o processo de abolição

Na cidade de Ponta Grossa, por ocasião de sua viagem ao Paraná, foi D. Pedro II recebido por um cidadão, que o cativou por sua hospedagem fidalga, mas despida das exigências protocolares. Após o almoço, no dia da partida, o anfitrião disse:
— Senhor Imperador, eu podia ter feito mais alguma coisa. Podia ter matado mais uma vitela, mais um peru, mas preferi assinalar por outro modo a vossa passagem por esta terra e a honra de vir a esta vossa casa. Libertei todos os meus escravos, que são mais de setenta, e peço a Vossa Majestade o favor de lhes entregar as cartas de liberdade.
Essa alocução tão simples quanto eloqüente emocionou profundamente o Monarca, que agradeceu o gesto de benemerência do digno paranaense. Por ocasião das graças, o Governo levou ao Imperador o decreto fazendo-o oficial da Ordem da Rosa. Ao apresentarem-lhe o decreto, disse o Monarca ao ministro do Império:
— Isto é pouco para esse benemérito. Faça-o barão!
— Mas, Majestade, ele é quase analfabeto!
— Não será o primeiro. E este é muito digno. Mande-me o decreto fazendo-o Barão dos Campos Gerais.

Quando a Ordem dos Beneditinos, em 1866, proclamou a liberdade dos filhos de seus escravos, o Imperador foi pessoalmente ao Mosteiro de São Bento felicitar o Abade Geral, a quem entregou em mão própria uma condecoração.

D. Pedro II tinha uma antipatia visceral contra os que se haviam envolvido no degradante tráfico de negros. A condescendência que sobre isso tiveram alguns políticos, mesmo aqueles tidos então ou posteriormente como abolicionistas, ele nunca a teve. Joaquim Nabuco diz que, se não fosse o Imperador, os piores traficantes de escravos teriam sido feitos condes e marqueses do Império. Pereira Marinho, por exemplo, tornou-se opulento às custas do tráfico. Depois de deixá-lo, envidou todos os esforços para obter uma condecoração, um título, uma fita. O Imperador nunca transigiu. Afinal Pereira Marinho conseguiu fazer-se conde, mas em Portugal.

Quando foi promulgada a Lei Áurea, Dom Pedro II se encontrava em Milão, gravemente enfermo. Fora atacado de uma pleurisia, complicada com febre palustre. Os médicos aconselharam a ocultar do paciente as notícias que chegavam do Rio diariamente.
A 22 de maio os médicos perderam as esperanças de salvá-lo, e declararam à Imperatriz que chegara o momento de chamar o sacerdote. O Arcebispo de Milão assistiu D. Pedro II, que após a confissão recebeu os últimos sacramentos da Igreja Católica. Ele estava de tal modo enfraquecido, que mal podia falar. A Imperatriz achou conveniente, então, informá-lo da grande notícia recebida no dia 13. Imediatamente seu olhar se reanimou.
— Não há então mais escravos no Brasil?
— Não. Votou-se a lei em 13 de maio. A escravidão foi abolida.
— Rendamos graças a Deus! Telegrafem imediatamente à Isabel, enviando-lhe a minha bênção com os meus agradecimentos à Nação e às Câmaras.
Depois, voltou-se ligeiramente. Os que o cercavam julgaram que estivesse moribundo. Mas seu patriotismo deu-lhe forças para pronunciar estas tocantes palavras:
— Grande povo! Grande povo!...
E correram lágrimas de seus olhos.
A alegria profunda que sentiu, ao saber que todos os seus súditos seriam livres para o futuro, produziu em todo o seu ser uma comoção eficaz e salutar. Desde então se acentuaram as melhoras. Aos poucos desapareceu o perigo, e ele não tardou a restabelecer-se.

Quando D. Pedro II chegou de sua viagem à Europa, após a Lei Áurea, o Conselheiro João Alfredo, presidente do Gabinete, apresentou-lhe o texto da “Fala do Trono”, que o Imperador deveria ler diante das Câmaras. No tópico em que se aludia à lei de 13 de maio, intercalou Sua Majestade, com a própria letra, estas palavras significativas: “...cuja decretação tanto me consolou das saudades da Pátria, minorando os meus sofrimentos físicos”.
Assistindo à leitura destas palavras, a Princesa Isabel acolheu-as como o único elemento de tranqüilidade que lhe faltava:
— Fico muito contente que a lei de 13 de maio tenha tido esta última sanção.

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