FATOS DO BRASIL IMPÉRIO

Bem vindo ao blog FATOS DO BRASIL IMPÉRIO. Aqui são narrados fatos da época do Império, geralmente pouco conhecidos, extraídos do livro REVIVENDO O BRASIL-IMPÉRIO, que publiquei sob o pseudônimo Leopoldo Bibiano Xavier. Leitura muito útil, que dá uma visão realista do modo como o Imperador Pedro II conduzia os destinos do País.
Você está convidado a visitar também os sites referentes ao meu livro mais recente, A VOLTA AO MUNDO DA NOBREZA, que contém mais de 1.700 fatos mostrando a atuação da nobreza em diversos países e épocas:
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Leon Beaugeste

6.6.08

14 - PRINCESA ISABEL, A REDENTORA

Nobreza de alma e simplicidade na vida da Princesa Isabel

A Princesa Isabel, menina ainda, saiu a passeio com D. Pedro II. Todos se curvavam diante da carruagem em que estavam. Em dado momento, a princesinha perguntou:
— Papai, toda essa gente constitui o povo?
— Sim, uma parte do povo – respondeu o Monarca.
— E algum dia esse povo me pertencerá?
— Não, minha filha. Você é que pertencerá ao povo.

A Princesa Isabel e Amanda Paranaguá, futura Baronesa de Loreto, brincavam, quando crianças. Com uma machadinha de brinquedo em punho, a Princesa empenhava-se em decepar um pequeno tronco de árvore. Num gesto de afetuosidade, Amanda veio por detrás, para abraçá-la. No instante em que ia abraçá-la, Isabel levantara a machadinha, atingindo o olho da amiga. Não foi um ferimento grave, mas gerou uma indelével cicatriz, e acabou reforçando um elo de amizade que as uniu por toda a vida. Tinham tão grande afeição e dedicação mútuas, que a Baronesa decidiu acompanhar a Princesa Isabel no exílio.

O embaixador argentino Vicente Quesada descreveu o ambiente que cercava a Família Imperial do Brasil: “A Princesa herdeira era de trato simples, amável e bondosa, como também era seriamente lhano e sem altivez o Conde d’Eu. Mais de uma vez me receberam rodeados de seus filhos pequeninos”.

No dia 24 de novembro de 1868, a Princesa Isabel e o Conde d’Eu visitaram a cidade mineira de Baependi, hospedando-se no palacete do comendador José Pedro Américo de Matos, que era pessoa muito rica e muito benquista na cidade. No entanto, por ser mulato, procurava não freqüentar as festas sociais, para evitar constrangimento a certas damas da sociedade, especialmente nos bailes. Notara mesmo certa resistência, quando se tratava de dançar com algumas delas.
Como anfitrião do casal imperial, era-lhe impossível deixar de comparecer ao grande baile de homenagem, que a cidade ofereceu. Mas enquanto todos se divertiam com a primeira dança, uma quadrilha, o comendador permaneceu alheio, olimpicamente indiferente e distraindo-se em contemplar, ora os dançarinos, ora a multidão que se comprimia na rua.
À Princesa Isabel não passaram despercebidas a situação e a atitude do comendador. Quando a orquestra iniciou a primeira valsa, o Conde d’Eu tomou a Princesa pela mão, levou-a ostensivamente, pelo meio do salão, até em frente do seu anfitrião, e ofereceu-lha como par. A Princesa sorria, fitando-o. E o sorriso era de tal modo um convite irrecusável, que ele logo se refez da surpresa, iniciando com ela aquela primeira valsa. Tal foi a estupefação, que durante alguns instantes o par dançou sozinho.
Depois dessa bela atitude do casal imperial, todas as atenções se voltaram para o comendador. A uma dama das mais elegantes, que insinuara sentir imenso prazer em tê-lo como par, respondeu:
— Não, minha senhora, muito obrigado. Queira desculpar-me, mas quem dançou com a Princesa não pode mais dançar com outra mulher.
Esse gesto de nobreza repetiu-se no Palácio São Cristóvão, com o famoso engenheiro negro André Rebouças. O historiador Luís da Câmara Cascudo comenta: “A gratidão do Dr. Rebouças ficou brilhantemente provada a 16 de novembro de 1889, quando voluntariamente se exilou, embarcando junto com a Família Imperial”.

Sayão Lobato, ministro da Justiça em 1871, solicitou a assinatura da Princesa Isabel para uma sentença de morte contra um escravo que matara o senhor. Para movê-la a assinar, estudou um discurso. E desfechou-o na sessão do despacho, contando o episódio de D. Maria I – a louca –, que se vira em igual situação. À mãe do condenado, que lhe implorava a vida do réu, dissera:
— A minha bondade e o meu coração de mulher perdoariam. Mas a minha cabeça de rainha manda condená-lo.
Depois dessa narrativa, o ministro julgou ter vencido a obstinação da Princesa. Mas ela sorriu, e muito simples, muito ligeira, exclamou:
— Mas, Sr. Sayão, minha tataravó era maluca!...
E não assinou.


A atuação da Princesa Isabel na causa abolicionista

Os brasileiros, na sua quase totalidade, imaginam que a Princesa Isabel apenas assinou a Lei Áurea, e que ela teria apenas consentido em assiná-la. Esse é o mérito único que lhe atribuem. Entretanto, não foi só isso o que ela fez. Podemos afirmar hoje que, se não fosse o seu empenho em levar avante essa questão, não teríamos chegado, da maneira pacífica como chegamos, ao termo de tão formosa campanha. Por colocar a paz doméstica, a satisfação íntima do lar à altura das mais legítimas aspirações humanas, foi que incentivou os defensores da Lei do Ventre Livre, seguindo as pegadas do Visconde do Rio Branco. Preparou o ambiente para a Lei dos Sexagenários, e terminou apressando a vitória da libertação total dos cativos, embora sabendo que daria em troca de sua maravilhosa atitude o trono que lhe pertencia.

Discutia-se nas Câmaras a Lei do Ventre Livre, com discursos empenhados do Visconde do Rio Branco e de outros abolicionistas. Cinco meses duraram as discussões, com momentos de desânimo e de entusiasmo. A Princesa Isabel se empenhava com os ministros, para que apoiassem a aprovação da lei. O próprio Rio Branco, sempre que conferenciava com a Princesa, parecia voltar a plenário mais disposto, mais animado, mais fortalecido para continuar a batalha. Numa dessas vezes, quando ele se achava especialmente receoso, a Redentora fez o que pôde para animá-lo. Logo após a entrevista, encaminhou-se para o seu oratório, ajoelhou-se e implorou insistentemente a proteção divina para os que trabalhavam pela aprovação da lei.

Após a votação da Lei do Ventre Livre, em 28 de setembro de 1871, o povo em massa esperou o Visconde do Rio Branco. Quando ele apareceu à porta do Senado, recebeu a manifestação mais ruidosa e comovente que já se fez a um homem público no Brasil. A Princesa Isabel foi-lhe ao encontro, com a fisionomia radiante, e cumprimentou-o com efusão:
— Bravos, Visconde! A sua vitória foi o mais belo exemplo em que os nossos homens de Estado se devem mirar.
— Perdão, Princesa! Se venci, é porque tinha apoio em Vossa Alteza e nos meus luminosos pares legislativos. Logo, o mérito é menos meu que da ilustre e humanitária Regente e dos insignes representantes do País.
— Que diz, agora, da situação dos nossos irmãos cativos?
— O cativeiro, praticamente, não mais existe no Brasil. A religiosidade da combativa Regente já o aboliu convenientemente.

A Princesa Isabel insistia com o Barão de Cotegipe para que o Ministério assumisse uma posição mais decidida na questão da abolição, sem o que sua força moral cada vez mais se perdia. Cotegipe aconselhou-a a manter-se neutra “como a Rainha Vitória”, numa disputa que dividia tão profundamente os partidos. Ela retorquiu:
— Mas eu tenho o direito de manifestar-me, e a Rainha Vitória é justamente acusada por sua neutralidade, prejudicial aos interesses da Inglaterra.

Em março de 1888, a propósito da prisão de um oficial do Exército pela polícia, a Princesa Isabel tomou uma posição francamente contrária à do presidente do Conselho, que em conseqüência propôs a demissão do Gabinete, logo aceita pela Regente. Ao se demitir, Cotegipe perguntou:
— A quem Vossa Alteza quer que eu chame para organizar o novo Gabinete?
— O Sr. João Alfredo – respondeu sem hesitação.
Mais tarde ela revelou:
— Conhecendo as idéias do Sr. João Alfredo, estava convencida de que o que ele fizesse seria bom. Ele assumiu a presidência do Gabinete com a promessa de tentar qualquer coisa pela sorte dos escravos.52
De fato, dois meses depois apresentou um projeto de abolição total, que afinal resultou na Lei Áurea.

Entusiasmada pela veneração com que a saudavam os abolicionistas jubilosos, após a assinatura da Lei Áurea, a Princesa Isabel se encontrou com o Barão de Cotegipe, que fora o chefe do gabinete de 1886-1888, e que, nessas funções, lhe observara os riscos que corria a sorte do Império com a providência radical que os abolicionistas pleiteavam:
— Então, Sr. Cotegipe! A abolição se fez com flores e festas. Ganhei ou não a partida?
O Barão, cujas previsões políticas o haviam apeado do poder, mas que continuara a opor-se de corpo e alma à extinção do cativeiro, pelo colapso econômico que disso sobreviria, fitou-a e respondeu:
— É verdade. Vossa Alteza ganhou a partida, mas perdeu o trono.
Pouco tempo depois foi proclamada a República.
A Princesa Isabel, ferida pelo destronamento, ao passar pela sala do Paço onde assinara a Lei Áurea, bateu com energia na mesa em que a subscrevera, e disse:
— Se tudo o que está acontecendo provém do decreto que assinei, não me arrependo um só momento. Ainda hoje o assinaria!


No exílio, a Princesa Isabel manteve inalteráveis seu amor e sua dedicação ao Brasil

Depois de proclamada a República, os revoltosos queriam a todo custo ver-se livres da Família Imperial, para que o golpe pudesse caminhar sem tropeços. O Governo Provisório decidiu então oferecer a vultosa quantia de 5.000 contos de réis, para suas despesas na Europa. O Coronel Mallet compareceu à presença do Conde d’Eu e da Princesa Isabel, transmitindo-lhes a notícia:
— Agora, ao subir, fui informado de que a esta hora está sendo lavrado o decreto que concede a Sua Majestade o Imperador 5.000 contos de réis para as suas despesas.
— Nós não fazemos questão de dinheiro – disse a Princesa. O que me custa é deixar a Pátria, onde fui criada e tenho as minhas afeições. É isto o que mais lamento perder. Não o trono, nem ambições, que não tenho.

Em 13 de julho de 1901, quando Santos Dumont contornou a torre Eiffel com o seu balão, a Princesa Isabel o convidou a ir à sua casa, para narrar-lhe a aventura. O próprio Santos Dumont conta o episódio:
“Quando acabei a minha história, a Princesa me disse:
— Suas evoluções aéreas fazem-me recordar o vôo dos nossos grandes pássaros do Brasil. Oxalá possa o senhor tirar do seu aparelho o partido que aqueles tiram das próprias asas, e triunfar, para glória da nossa querida Pátria!”
Alguns dias depois, a Princesa mandava-lhe esta carta: “Envio-lhe uma medalha de São Bento, que protege contra acidentes. Aceite e use-a na corrente do seu relógio, na sua carteira ou no pescoço. Ofereço-lha pensando na sua boa mãe, e pedindo a Deus que o socorra sempre e o ajude a trabalhar para a glória da nossa Pátria”.

Ao saber que o Dr. Ricardo Gumbleton Daunt não queria aceitar a cadeira de deputado que lhe coubera numa das eleições, por ser visceralmente monarquista e não querer, portanto, ocupar posto algum de saliência no Brasil sob outra forma de governo, a Princesa Isabel escreveu à irmã do eleito: “Diga ao seu irmão que ele deve aceitar a cadeira de deputado e propugnar pela grandeza moral, econômica e intelectual de nossa Pátria. Não aceitando, ele estará procedendo de maneira contrária aos interesses da coletividade. De homens como ele é que o Brasil precisa para ascender mais, para fortalecer-se mais. Faça-lhe, pois, sentir que reprovo sua recusa”.

A sensibilidade e o patriotismo da Princesa Isabel se revelam num documento íntimo, onde escreveu: “A idéia de deixar os amigos, o País, tanta coisa que amo e que me lembra mil felicidades que gozei, faz-me romper em soluços. Nem por um momento, porém, desejei uma menor felicidade para minha Pátria. Mas o golpe foi duro”.
Este sentimento de identidade com o seu povo, ela o possuiu de tal modo, que além de viver na tradição popular, ela ficou figurando no folclore da Abolição. Estas quadrinhas, cantadas pelas crianças brasileiras, confirmam esse sentimento popular:
“Princesa Dona Isabel,
Mamãe disse que a Senhora
Perdeu seu trono na terra,
Mas tem um mais lindo agora.

No céu está esse trono
Que agora a Senhora tem,
Que além de ser mais bonito
Ninguém lho tira, ninguém”.

***

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6 comentários:

Ana Bittencourt disse...

Estava procurando informacoes sobre a visita da Princesa Isabel a Vila Cristina em 1868 e achei seu blog. Fiquei muito feliz, ja li bastante, e adorei. Vou voltar sempre.
Marilia

Ana Bittencourt disse...

Caro Dr. Beaugeste,
Li em algum lugar que a Princesa teria ido às Aguas Virtuosas (Baependi?)por dois meses. E na volta, a convite de um conselheiro real, teria visitado a Vila Cristina (nome dado em homenagem aa Imperatriz). V. sabe se ela ja estava em Baependi quando houve o baile que V. narra? Porque eles nao viajariam soh por uma semana naqueles tempos. Tudo o que li ateh agora diz que ela passou por Cristina em 1 de dezembro. V. saberia me dizer, por gentileza?
Marilia

Anônimo disse...

considerações monárquicas,

sr dr beaugeste,

Com muita clareza a Bíblia Sagrada nos mostra que "DEUS" permitiu somente a Forma "Monarquia" de se governar uma nação. É o que observamos lendo os Livros Sagrados de primeiro e Segundo a Reis encartados no Velho Testamento. Pois bem, o sr poderia se possível esplanar mais sobre a questão em tela, abordando com maior ênfase a questão mencionada acima.

Aguardo se possível

Grato

Paulo-010

controvento-desinventora disse...

Adorei o blog. Encontrei-o pesquisando sobre a Imperatriz Teresa Cristina e Princesa Isabel e acabei percebendo, além do que vim buscar, o importante papel das duas Grandes Mulheres do Império.
Parabéns pelo blog!

controvento-desinventora disse...

Adorei o blog. Encontrei-o pesquisando sobre a Imperatriz Teresa Cristina e Princesa Isabel e acabei percebendo, além do que vim buscar, o importante papel das duas Grandes Mulheres do Império.
Parabéns pelo blog!

Fernando tredicci disse...

Gostaria de saber se possui informações sobre um possível Programa de metas e desenvolvimento para o 3º Reinado quando da posse da Princesa Isabel como Imperatriz. Obrigado e espero ser bem sucedido em meus estudos sobre a continuidade da Monarquia.
Agradecido, Fernando Tredicci